terça-feira, março 18, 2008

Crash - No Limite e os Clichês

Crash - No Limite é sem dúvida um dos meus filmes prediletos. Para alguns não passa de um filme formulaico e cheios de clichês, julgando-o apenas pela forma e estrutura, sem analisar a importância destas para a idéia do filme. O que não se percebe em Crash é que a sua forma, uma estrutura narrativa composta por várias estórias e personagens que se chocam, possibilita mostrar com maior eficiência e sensibilidade a complexidade da natureza humana.

Crash - No Limite conta a estória de diversos personagens em várias tramas que se cruzam, tendo como fundo a cidade de Los Angeles. O filme retrata nessas várias estórias a posição defensiva que tomamos constantemente em nosso atual contexto de violência e medo, mas principalmente, mostra o que ocorre quando essas pessoas se chocam, e as diferenças tornam-se, além de um ponto fraco, um motivo de desconfiança e um potencializador do medo. No decorrer do filme, vemos estórias como a da mimada esposa de um importante promotor que, após um assalto, teme que o chaveiro que concerta a porta de sua casa tenha planos de roubá-la; e de um chaveiro que após ter uma difícil conversa com um Persa, que pouco fala inglês, acaba sendo mal compreendido; e de um Persa que julga ter sofrido preconceito, porém acusando a pessoa errada. E assim segue um conjunto de estórias em que suas reviravoltas nos revelam as contradições típicas do ser humano em uma realidade violenta e de constante tensão entre indivíduos.

Crash tem seu roteiro baseado nesse tipo estrutura já bastante explorada, e encontra em certos clichês formas de surpreender o público. Devido essas características narrativas, o filme foi um tanto incompreendido e, consequentemente, subestimado por alguns críticos e parte do público. A princípio, sempre estamos tentados a julgar a utilização de clichês, e ocorre que poucos tem a percepção de que a utilização destes não é algo condenável se for feito com cuidado, sensibilidade e evitando o maniqueísmo.

Se pararmos para pensar, antes de uma determinada cena, trama, fala ou reviravolta tornar-se um clichê, esta foi usada uma primeira vez e, provavelmente, como um elemento coerente ou importante ao roteiro onde foi incluso. Dessa forma, assim como a primeira vez que aquilo que hoje caracterizamos como clichê foi usado, em uma suposta quadragésima vez esse mesmo elemento poderia ter a mesma eficácia se utilizado da mesma forma, ou com a mesma precisão e sinceridade. A fraqueza do clichê reside na pobreza da utilização deste como mera forma de incluir esse elemento -já convencionado como bom ou como um elemento que funciona perante o grande público - a outros roteiros ou produções. Ou seja, se soa como clichê a estória de um jovem digno, respeitoso e que nos impreciona ao matar outra pessoa, esta mesma não soaria assim se, com a sensibilidade da direção e do roteiro, nela for desenvolvida cuidadosamente a complexidade e contrariedade do comportamento da personagem. E mais, essa estória não soaria também como clichê quando considerarmos o contexto ideológico e conceitual em que ela foi desenvolvida.

É exatamente o que acontece em Crash. O novato policial, interpretado por Ryan Phillippe, que durantes boa parte do longa nos mostra um comportamento averso a qualquer preconceito, em outro instante age preconceituosamente, chegando a matar um negro por pura insegurança e pré-julgamento. Nesse caso, o clichê foi perfeitamente encaixado como forma de solidificar e dar mais complexidade à questão do racismo (nesse exemplo, não declarado, o que por si só sinaliza uma contradição curiosa) e da constante defenciva à violência a qual nos encontramos atualmente, fortificada pelos medos, e estes, potencializados pelo preconceito (como uma pessoa sã, sentimos medo e evitamos nos colocar em situações de risco ou ser assaltados, mas esse medo pode ser potencializado quando um negro mal vestido atravessa a rua). Além disso, a estória desse personagem marca um belo contraponto a estória do personagem de Matt Dilon, que em um primeiro momento, tem atitudes racistas, e em outro, arrisca a própria vida para salvar uma negra que havia submetido a uma cruel humilhação. As contradições ressaltadas pela cena em questão e a catárse promovida por esta só enriquecem o filme, que já nos apresenta diversas formas de se agir preconceituosamente e como esse sentimento pode se manifestar. No entanto, nada disso seria feito sem uma direção delicada e sensível, assim como um roteiro muito bem elaborado.

Outro exemplo marcante de clichê em Crash - No Limite é a repetição de determinado evento: uma batida de carro, no início e no fim do longa. Da mesma forma como o intercruzamento das estórias é utilizado como forma de ressaltar o impacto e choque entre as diferenças hoje, já que, estes promovem as oportunidades ideais para estes eventos; as batidas de carros que abrem e fecham o filme são, além de um forma dinâmica de abrir e fechar a estória, uma maneira de representar o choque entre as váriedades (no filme, raciais). Esse tipo de repetição poderia soar pobremente caso fosse usado sem um propósito sólido e coerente, no entanto, para Crash, é mais um exemplo em que a forma complementa o conteúdo.

Percebe-se que existe uma preponderância muito forte, por uma maioria, em julgar clichês antes mesmo de se entender o funcionamentos destes e a forma como foram utilizados. Não sou nenhum defensor dos clichês, na maioria das vezes empobrecem e são mal utilizados por cineastas e roteiristas sem um menor talento. Mas com um mínimo de sensibilidade e precisão, este pode se tornar um trunfo, e é isso que Crash - No Limite faz. Aliás, arrisco-me a dizer que em Crash não há clichês, pois como disse, clichês são as formas (ou fórmulas) degradadas de elementos já tão repetidos na história do cinema, e se revigorados ou resignificados, não seria justo denominá-los ainda dessa forma.

13 comentários:

Euzer Lopes disse...

Rafael, eu lembro que quando o filme "Crash" passou nos cinemas, teve gente que ficou questionando: "como este filme ganhou o Oscar?" Simples, ganhou porque ele é bom. Porque ele teve, estes predicados que você citou e muitos outros.
Há "pseudo-intelectuais" que já chegam ao cinema armados até os dentes para falar mal.
Há um filme, nacional, que esteve recentemente em cartaz, no circuito alternativo (principalmente em São Paulo) que tem uma estrutura muito parecida: "O signo da cidade". Ouvi muitos elogios (eu, por exemplo, adorei). Quando eu assisti a este, lembrei-me na hora de "Crash".

Daniel Augusto disse...

Muito bom o filme...

mas como dizem por ai clichê é clichê e vice e versa...

enfim...

o filme sabe lidar com isso e supera a expectativa...

bye

http://www.causagendi.blogspot.com/

Rafael Carvalhêdo disse...

De fato, "pseudo-intelectuais" e "pseudo-críticos" amam julgar um filme pelo que ele aparenta ou pela sua origem, e mais, amam parecer espertos e adoram usar o termo "cinema de arte" pra separar o cinema america do cinema europeu. Tosco!

Essa é mais pura prova de preconceito, ou seja, são incapazes de criticar.

Crash é o exemplo desses filmes em que pessoas que não sabem analisar de fato acabam por julga-lo errado. Tá certo que a Academia várias vezes erra, mas em si tratando de Crash, eles acertaram na mosca em dar o Oscar de melhor filme.

Agora que vc falou deste "Signo da Cidade" fiquei com vontade de ver... vou guardar esse nome!!!

Anônimo disse...

poh filme muito bom,, gostei tinha até algumas partes engraçadas,.,,,rsrs,,,mas excelente filme q retrata a realidade...

aki passa no meu depois vlw...e comenta

Marcos Lima disse...

Ainda não tive a oportunidade de assistir Crash. Mas o bacana e interessante é que seu texto deixa o leitor com vontade de assistir o filme.
Digamos que ele serve até pra entender o que se passa na cabeça do ser humano!!

Abraços
http://senhor-do-tempo.blogspot.com/

Unknown disse...

O Euzer lembrou bem de "Signo da Cidade". Um filme que justificou meus R$15.00.
Vi no post anterior que vc também fala sobre filmes antigos, então vou te sugerir dois filmes que ADOREI p/ que vc possa assistir e quem sabe render uns 2 posts...
- Ben-Hur ( recordista de Oscars junto à Titanic. Mas até hoje não foi superado.)
-Espártacos (são duas versões. Pra mim as duas são ótimas)
Bjs.!


http://noticias-irrelevantes.blogspot.com/

Euzer Lopes disse...

O signo da cidade foi um filme que, creio eu, passou somente na cidade de São Paulo. Foi lançado na Mostra Internacional de Cinema (novembro/2007) e entrou em cartaz no aniversário da cidade (25/1/2008) em várias salas do chamado "circuito alternativo".
O personagem principal do filme é a cidade de São Paulo.
Se quiser, acesse www.osignodacidade.com.br

Meu MSN: elguerrerooriginal@hotmail.com

"Decifra-me ou te devoro" disse...

Bem, eu não sou lá uma crítica de cinema com um gosto refinado e que sabe apontar perfeita os altos e baixos de um filme... sou apenas uma pessoa normal (na medida do possivel) que adora assistir filme por acha que é uma das mais belas formas de arte que existe! Eu particularmente adorei Crash e sempre recomendei ele pra todo mundo que me pede uma dica de um bom filme! O acho muito bem bolado e com um enredo maravilhoso! Adoro como as personagens e suas estórias vão se ligando no decorrer do filme!

Euzer Lopes disse...

Meu amigo, você me adicionou ao MSN.
Pois quando fui te procurar na lista, não achei!
Mande uma mensagem pra mim, mesmo que eu esteja off, por favor.

Davi Arloy disse...

Ah, eu nunca vi Crash não :/

Mas parece ser bacana.

Bom blog e obrgado pelo bom comentário lá no blog.

Abs

Mariana disse...

eu adooro crash..
acho um filme fantástico com todas as suas peculiaridades.

ps* eu poderia comentar mais, só q estou com fome e isso me desconcentra! haha beijos

Luana! disse...

Aaaahhhhhhhhhhh

To estreando o trocinho de dizer se é bom ou ruim!

ahaauhau

Unknown disse...

Outro filme que eu adoro cara...
Muito bem feito, apesar da minha irmã discordar...

mas é muito bom mesmo véio...

abraços
http://borarir.blogspot.com