sexta-feira, outubro 10, 2008

Alice - Na Toca do Coelho

Não é bem no país das maravilhas, mas quem sabe na capital! São Paulo, em Alice, é fonte dos desejos da protagonista que dá nome a nova série da HBO Latin Americana, exibida aos domingos, às 22 horas, no canal. Saída da cidade de Palmas, em Tocantins, Alice abandona os preparativos de seu casamento para ir ao enterro de seu pai, que havia se suicidado. Uma vez fisgada pelos encantos da cidade, após um breve e intenso estranhamento, a personagem encontra motivos de sobra para permanecer nela, seja pela confusa noite badalada, pelas cobranças dos familiares em Tocantins ou pela descoberta da amplitude do mundo, que só uma cidade como São Paulo poderia proporcionar.

De cara exibindo um visual e estética tipicamente cinematográfica inspirados nas novas tendências televisivas norte-americanas e, atualmente, mundiais, no que se refere a convergência das linguagens cinematográfica e televisiva, Alice assume o estilo adulto de série, sem puderes e dando a si mesma a liberdade para criar e desenvolver essa estória com a sinceridade devida. O trabalho fotográfico, que busca extrair das luzes paulistanas todo o poder de sedução da grande megalópole, se revela quase que completamente cinematográfico, investindo em planos bem elaborados que realçam as sensações, como na cena do suicídio do pai de Alice, ou para simbolizar passagens importantes, como a "libertação" da protagonista que, após passar por um longo túnel em uma seqüência marcada pelo frenetismo, tem a sua vida radicalmente modificada, transitando de sua simples e ingênua vida para o curioso cotidiano no "país das maravilhas", pela qual a personagem passa a ter a noção de um mundo maior e, consequentemente, o desejo por este. O casamento, planejado, portanto, resignifica-se como um elemento aprisionador, agora que a personagem está frente a milhões de possibilidades. E é entusiástico marcar o fim de noite de Alice a partir de um envolvimento sexual com um típico gringo que visita São Paulo a trabalho, e que assume representativamente uma importante passagem tão comum em uma cidade global para o que existe fora do próprio cerco nacional. Nesse instante, as possibilidades vislumbradas e curiosidades de Alice vão mais além, e São Paulo se torna praticamente irressistível.

A trilha funciona adequadamente, resumida praticamente em sons eletrônicos contextualizantes do ambiente metropolitano, quando não, saltando para o melodrama comedido, típico também das tendências das séries de TV's modernas, mas que pontua muito bem os momentos mais sensíveis da personagem. Andréia Horta surpreende como Alice, considerando-se preconceituosamente o trabalho anterior ao qual ela participou na TV Record. A atriz é competente em conduzir a personagem de acordo com as exigências da estória, já que as descobertas desta é que dão o sentido da série e concentrar-se na transição de sua simples concepção de vida para o ambicioso desejo de conhecer o mundo é bem mais importante que desenvolver de cara qualquer complexidade dramática mais profunda da personagem. O elenco estréia muito bem e vale destacar a empolgante participação de Carla Ribas, que, tenho a forte impressão, renderá bons momentos.

Com mais de 1 milhão até agora bem investidos pela HBO, Alice promete, com base no primeiro e ótimo episódio da série, mostrar grandes aventuras embarcadas pela personagem na descoberta do "país das maravilhas", ou como pode vir a ser também, da selva metropolitana. Agora resta acompanhá-la na expedição pela grande cidade cheia de faces, possibilidades e que nunca dorme.