sexta-feira, novembro 16, 2007

The Bubble

É interessante como entre os últimos grande filmes do gênero "romance", estão aqueles protagonizados por casais homossexuais. Ainda não entendi bem o que isso quer dizer dentro da arte cinematográfica, mas a sutileza com que os diretores trabalham essas estórias, além de diminuir o preconceito e naturalizar a relação entre pessoas do mesmo sexo, empolga e abre um leque de possibilidade a serem trabalhadas dentro desse gênero que já estava sendo esquecido.

The Bubble, no entanto, não se resume apenas a contar a estória de um casal homossexual, como em O Segredo de Brookback Mountain, mas leva a situação, já complexa pelo atual contexto de preconceito, a um nível mais intenso e polêmico. Ao contar a desventura de dois homens, um palestino e um israelense (inimigos por natureza histórica) que desenvolvem um romance em meio aos conflitos entre as duas nações - The Bubble vai além da polêmica pauta da diversidade sexual em meio a sociedade ainda hipócrita, e casa da melhor forma possível, dentro de uma estética limitada (algo que vou explicar mais a frente), essa temática com a questão do ódio entre dois povos.

Três jovens dividem um apartamento na cidade de Tel Aviv, em Israel. O balconista Noam, o gerente de café Yali e a vendedora Lulu, a única hétero do trio. A rotina dos personagens é abalada quando o palestino Ashraf chega a casa de Noam e inicia um namoro com este. O casal, com o tempo, sofre as consequências das questões políticas que envolvem as origens de cada um.

The Bubble tem início mostrando as tensões existentes entre os dois povos no cenário, talvez, mais representativo, que é a fronteira entre os dois países. Enquanto uma mulher palestina grávida entra em trabalho de parto e é encarada friamente pelos militares israelenses, Noam e Ashraf tem seu primeiro contato. Mesmo que a primeira cena tente marcar de imediato as dificuldades que os personagens irão enfrentar, logo esquecemos-as quando a direção do filme toma rumos inesperados ao tentar naturalizar e conferir um ar pop e universal à vida israelense. Com isso vemos o dia-a-dia de Noam, Yali e Lulu como se estes morassem em uma metrópole qualquer da América ou Europa, em que reality-shows como American Idol (no caso, Israel Idol) são as maiores audiências da TV Aberta; e raves, boites e bares são a diversão dos jovens israelenses.


A princípio, essa decisão do diretor Eytan Fox nos parece uma simples banalização das temáticas polêmicas as quais o filme aborda, em prol de uma "realidade" que fosse mais atrativa ao grande público. Ora, mas quem disse que a vida do jovem israelense é diferente daquela do jovem ocidental? Mesmo que os telejornais e agências de notícias nos mostrem um-quarto da vida em Israel e no Oriente Médio em geral, não é difícil percebermos que a vida por lá não é muito diferente dessa daquí, principalmente quando levamos em conta a globalização cultural.


O filme, em um primeiro momento, dedica-se a levar o telespectador a se identificar com a vida israelense a partir de tramas pequenas e até certo ponto "bobas", como a dificuldade de Lulu em encontra um homem que não queira apenas sexo, mas um relacionamento sério, uma subtrama que nada tem a ver com a temática do filme. The Bubble, porém, cresce consideravelmente quando parte das questões afetivas dos personagens e encontra o âmbito político ao qual o romance dos protagonistas toma seu curso dramático.


Trabalhando os problemas no romance dos personagens como uma versão micro da histórica guerra entre palestinos e israelenses, o longa nos apresenta à belíssimas cenas na última meia hora de filme, que trabalham a temática do homossexualismo e dos conflitos regionais. Como exemplo, a cena em que a irmã de Ashraf chora de vergonha em seu casamento quando lembra que o irmão é homossexual, algo completamente inaceitável na cultura palestina.


Contando com um ótimo elenco, uma trilha sonora lindíssima e desfeixo impressionantemente chocante, The Bubble nos obriga a levar o filme pra casa, apurando uma angustia, que só permanece no telespectador pelo grande truque do filme, que é mostrar o lado mais identificável da vida em Israel, tornando todas aquelas vítimas de atentados terroristas e homens bombas em muito mais do que estatísticas frias que vemos nos noticiáris todos os dias, mas em pessoas com alma, paixão, sonhos e inteligência - gente como a gente. A estética aparentemente pobre, pop e inapropriada para o tema possibilita, na verdade, que nos coloquemos no lugar daquelas pessoas que na maioria das vezes torcemos o nariz e olhamos com indiferenças, simplesmente porque os meios de comunicação são incapazes de nos mostrar quem são, que cultura é aquela e a humanidade dessas pessoas que morrem diariamente, vítimas do terrorismo. The Bubble apenas falha ao investir em alguns clichês baratos, como se tivesse que seguir a estética utilizada ao pé da letra; e também falha, ao não explorar o lado da Palestina da mesma forma que faz com Israel, o que revela uma certa tendenciosidade, algo até esperado de um país que não tem relação pacífica nenhuma com o outro.


The Bubble é a prova de que não importa a inteligência da estética utilizada; se é um filme que trabalha os aspectos psicológicos e sociais dos personagens de forma profunda, ou um filme light que diverte e aborda superficialmente uma temática. O que importa é o objetivo e qual é a melhor forma de alcançá-lo; e nesse caso, levar o público a se identificar com os personagens e a estória a partir de um filme leve e mais universalizado, foi o maior trunfo para que o objetivo de sensibilização do público às pessoas daquelas culturas fosse concluído. E saímos do cinema nos indagando: "Poderia ter sido com um amigo! Poderia ser aqui!"

2 comentários:

Luca disse...

The Bubble é "um soco no estômago".

Gostei muito da tua análise.

*^.^*

Anônimo disse...

Interessante teu "ponto-de-vista", Caio.
Mas, sabe o que eu mais gostei no filme? (além do sexo, que todo filme bom tem que ter...)
Foi o final.
A metáfora das crianças no céu como uma bandeira pela paz, pela pureza, pela igualdade, pela falta de preconceito, pelo amor gratuito, por tudo que as crianças podem nos ensinar ("Porque delas é o Reino dos Céus")
o Filme Orfeu Negro tb usa a mesma metáfora!